REPETÊNCIA ESCOLAR: HÁ GANHOS?
Sonia Penin
Por lei, toda criança brasileira tem direito a oito anos de escolarização. As estatísticas mostram, contudo, que no início dos anos 90, embora a maioria das famílias mantivesse seus filhos por dez anos na escola, a escolaridade média alcançada era de três anos e meio. Essa tendência atravessou o século.
A persistência dos altos índices de repetência, incidindo sobre os alunos mais pobres, mostra que tal fenômeno não é relativo apenas às suas características individuais: é uma questão social.
A pouca clareza quanto à natureza do fenômeno possivelmente contribui para a dificuldade da escola em lidar com sua população.
Ademais, estudos revelam que a repetência em massa não somente foi praticada na escola como consentida pela cultura.
A LDB (Lei de Diretrizes e Bases) da Educação Nacional, de 1996, na busca de um modelo democrático de escola, flexibiliza sua organização, torna obrigatória a recuperação dos alunos e institui a progressão continuada, sem prejuízo da avaliação da aprendizagem e da freqüência às aulas. O Conselho Estadual de Educação de São Paulo, considerando experiências existentes por todo o país e a LDB, manifestou-se, em 1997, favorável à organização do ensino fundamental em ciclos.
A progressão continuada está alicerçada em pressupostos consistentes sobre o desenvolvimento do conhecimento e da aprendizagem.
Não é uma idéia nova. Nos anos 50, eminentes educadores já a defendiam, invocando resultados de pesquisas que mostravam as conseqüências negativas da repetência na vida das crianças: sentimento de incapacidade, perda da noção de seu nível de realização, não-reconhecimento dos valores da escola.
Dante Moreira Leite defendia a idéia de que a reprovação escolar é mais grave do que as reprovações sociais, pois não permite nem sequer o direito de abandonar a atividade sem sofrer discriminações. Almeida Júnior, entendendo que a instituição de tal idéia implicava a transformação radical da escola, defendia a necessidade de ela se preparar para isso nos moldes do que ocorria desde os anos 40 em vários países; alertava para o fato de que as dificuldades de implementação só seriam conhecidas e vencidas na sua vivência.
Detectando a resistência de muitos professores em aceitar a idéia, Leite apontava a existência de três mitos: o da escola seletiva; o da possibilidade ou necessidade de classes homogêneas; o de que castigo é forma adequada de provocar a aprendizagem.
No ano 2000 ainda notamos vozes contrárias à progressão continuada, afirmando que é preciso voltar à prática da repetência. Quem ganha com isso? Não as crianças: a cada repetência, dobra a chance de elas repetirem novamente ou abandonarem a escola. Não os pais: muitos, convictos de que a escola é o único meio para que seus filhos progridam, quando repetem, culpam-nos ou a si mesmos. Não a nação brasileira: essa situação extemporânea para o terceiro milênio revela a face perversa de sua dívida social com uma parcela da sociedade.
Se não há ganhadores, perdedores há: além dos já mencionados, há a escola e seus profissionais.
A repetência em massa desvaloriza a escola, sugerindo incapacidade de sua parte em ensinar. Sem dúvida, questões concretas, como orçamento insuficiente e má administração, explicam parte das mazelas, mas há problemas de ordem subjetiva. Um deles é a não-convicção de que é possível reorganizar a escola para atender a todos os alunos.
Urge mudar a cultura escolar. Aceitar a mudança é um passo decisivo; na seqüência, há que se aprender a fazer as modificações. Tendo como mote nenhum a menos, pode-se variar tudo: tempos, espaços, didática, programação e sua seqüência; só o aluno é constante. Repensar essas questões exige a participação de todos. Crenças e práticas arraigadas só serão superadas pela ação e pela crítica teórica. Uma boa idéia pode se tornar um simulacro, caso o aluno não tome o lugar central do debate e das ações.
Se superarmos a concepção de uma escola punitiva e seletiva, que serviu apenas às elites, faremos a ruptura histórica. Sempre é tempo para essa aprendizagem. Professor, como dizia Guimarães Rosa, é aquele que, de repente, aprende e, dizemos nós, constrói uma nova cultura.
Fonte:
PENIN, Sônia. Repetência escolar: há ganhos? Folha de São Paulo, São Paulo, 06 abr. 2000. Disponibilizado inicialmente na Biblioteca do SIAPE - Sistema de Ação Pedagógica
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
Curso de informática
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Alguns profissionais da área da educação na cidade de Centralina estão participando de um curso de informática com as tutoras Maria Betânia e Hellen.